quarta-feira, 8 de julho de 2015

Entrevista Maria da Penha


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Entrevista
Maria da Penha
“As mulheres dos pequenos e médios municípios precisam ter garantias”
Desenvolvimento – Com a visibilidade que a Lei Maria da Penha ganhou, as mulheres passaram a denunciar seus agressores em grande quantidade. A que a senhora atribui o sucesso da lei?
Maria da Penha – A lei veio exatamente para atingir um ponto crucial na vida das mulheres. Veio dizer que as mulheres têm o direito de viver sem violência. E que, se querem romper um relacionamento que as maltrata, elas têm agora uma lei que lhes favorece para isso. A principal finalidade da lei não é punir os homens, mas punir os homens agressores. Aí entra naquele esquema: nas cidades onde a lei saiu do papel, as mulheres tomam coragem e denunciam. Mas nós temos ainda muitas mulheres envergonhadas e sem saber o que fazer da sua vida porque não sabem onde denunciar, não têm conhecimento de que podem ligar para o número 180 e pedir uma orientação de outra cidade mais próxima da sua onde exista essa política pública de atendimento ao funcionamento da lei. Agora, a imprensa é muito importante na divulgação da lei. Tem uma pesquisa, que foi feita, se não me engano, pela SPM (Secretaria de Políticas para as Mulheres) ou foi pelo Instituto Patrícia Galvão, que diz que 98% da população brasileira têm conhecimento de que existe a Lei Maria da Penha para as mulheres. Muitas não sabem como a lei funciona, mas sabem que essa lei existe.
Desenvolvimento – Mas houve mudança de comportamento e de cultura a partir da lei?
Maria da Penha – No início havia muita resistência e nem sempre o Estado cumpria seu papel de proteger a mulher ou de punir o homem agressor quando este era preso em flagrante. Hoje em dia já há uma conscientização maior. O Judiciário e várias outras instituições já têm seus núcleos de gênero, que estão trabalhando em conjunto. A criação da Patrulha Maria da Penha, por exemplo. São gestos que fortalecem a lei. Cada estado, cada instituição está procurando fazer o melhor para que a lei seja aplicada com segurança.
Desenvolvimento – O Ipea lançou um estudo mostrando que a Lei Maria da Penha ajudou a reduzir em 10% o número de homicídios. Como a senhora vê isso?
Maria da Penha – Vejo isso com muita alegria. É muito importante. Mas veja: se a lei conseguiu levar a uma diminuição dos homicídios, eu digo que essa redução se deu nos municípios em que ela saiu do papel. A maioria dos municípios brasileiros não tem a lei trabalhada porque não tem as políticas públicas.
Desenvolvimento – É verdade. O estudo também mostra isso: que a efetividade da lei não se deu no Brasil de forma homogênea.
Maria da Penha – Então meu raciocínio está certo.
Desenvolvimento – O que poderia ser feito para melhorar a lei e torná-la mais efetiva?
Maria da Penha – O que falta é os gestores públicos se sensibilizarem e fazerem com que as políticas públicas sejam criadas para que as mulheres dos pequenos e médios municípios tenham essas garantias. Não precisa ser exatamente em cada município. Que seja feito em municípios a partir de 70 mil habitantes ou de 100 mil. E que seja feito um trabalho em que os pequenos municípios vizinhos menores criem essas políticas públicas para dar chance à mulher de um município próximo recorrer a outro. Quer dizer, num primeiro momento, tem que se fazer alguma coisa. Num segundo momento, cada município individualiza sua política pública. As mulheres desses locais precisam de espaços que as atendam e que as encorajem a denunciar e a tomar uma decisão de sair daquela situação de violência doméstica.
Desenvolvimento – O que a senhora acha da Lei do Feminicídio, sancionada pela presidente Dilma Rousseff? Acha que a tipificação do crime e o aumento das penas vão ajudar a diminuir os homicídios de mulheres?
Maria da Penha – Acho que, se tivesse chegado algum tempo atrás, não faria muita diferença. Mas hoje ela está acoplada ao conhecimento que se tem sobre a Lei Maria da Penha. Então, é um passo a mais para que a lei atinja seu objetivo de cuidar e proteger as mulheres em situação de violência e evitar esses assassinatos. E no caso de acontecer, é importante que esse acontecimento vá para uma estatística, porque hoje, quando se fala em homicídios, estão inclusos homicídios de homens e mulheres. Mas está tipificado que aquela mulher morreu vítima da violência doméstica. E no momento em que a Lei do Feminicídio foi aprovada, essa estatística vai para o local certo. Porque aquela mulher foi assassinada por uma questão de gênero.
Postado Por: http://desafios.ipea.gov.br/

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